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terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Amigo sinto saudades de sorrir



Considero-me um homem silente.
O “não” dificilmente faz parte do meu glossário do dia-a-dia. Nunca o questionei, mesmo quando percebia que estava errado.
Acostumei-me a ficar na sombra, quieto, bem sossegado.
Na escola, sentava-se na última carteira, escondido. Em casa, isolava-me no meu quarto, no meu mundo. Foi sem dúvida alguma um colossal erro.
O mais espantoso é que ninguém considera a minha presença importante. Talvez não a seja mesmo!
Os meus companheiros sempre foram os livros. Amava-os. Mesmo mudos podiam falar. Não tinha muitos, mas os que tinha, eram suficientes para me fazer sonhar.
Cultivei assim o gosto de brincar com as palavras, de desabafar com as frases do meu desencanto.
A noite é a minha confidente, a lua, a minha eterna amante, as estrelas iluminam a minha galáxia de desilusão.
Amigo sinto saudades de sorrir. Saudades de partilhar a fracção oculta da minha existência.
Todos os dias de manhã, as pálpebras permanecem fixas ao meu mundo. As pernas inertes recusam-se a caminhar.
A custo e sem estímulo aninho-me junto ao espelho da casa de banho. Tenho de avançar. Necessito viver. Mas a imagem reflectida lança-me a negação da minha acanhada vontade.
Hoje especialmente olhei-me nos olhos fixamente. Após alguns minutos experimentei o frio do gueto onde habito percorrer-me as veias, até me rasgarem o coração.
As pernas vacilavam como poáceas fustigadas pelo vento forte da inércia, do desencanto.
Partilhei com o espelho, a dúvida, o sabor da incerteza e o medo do futuro sempre tão incógnito.
Como resposta apenas obtive o som da água que em cascata caía do lavatório já apinhado.
Fui assaltado pelo cônscio que existe num dos hemisférios do meu cérebro. Reconheço que o tempo age e transformava os seres, mas as esperanças mantêm-se firmes.
Conheci-te há muito amigo, se assim te poderei chamar, muitas vezes atenuas-te a pressão do meu dia-a-dia.
Contigo folguei, contigo estudei, contigo viajei, cantei e chorei.
Quando se fala em sentimentos, a palavra amizade germina e tudo circunda à volta dela.
Amizade não passa afinal de uma palavra que define muito, mas que nem sempre, significa aquilo que demonstramos e praticamos.
Dizemos que um gesto vale por mil palavras. Todavia não ouvi uma palavra, nem deslumbrei um simples gesto da tua parte.
Quando o astro-rei brilha, quando o céu está azul, desprovido de nuvens é fácil ser amigo, difícil é, quando existe a necessidade de o demonstrar nos momentos mais delicados da vida como num céu cerrado de nuvens negras que se agrupam como que aconchegadas conferenciando sobre a vida cá em baixo, que vai correndo à sua revelia.
Nas horas difíceis e de provação, nos minutos tristes e de sofrimento, tu não estiveste. Onde estavas afinal?
Amigo preocupa-se, luta, estende a mão mesmo em silêncio, confia. Oculta os segredos mais íntimos, que outrora desabafamos.
Amigo é aquela que afronta de uma molde ordeiro os problemas de frente sem necessidade de se esconder.
Amigo não deixa de ser homem se compuser um pedido de desculpas.
Amigo não se compra, conquista-se! E acredita, que a decepção de uma amizade é muito dura. Tão dura quanto a perda de um amor.
Amizade verdadeira existe? De facto estou cada vez mais céptico.
Como é possível alguém que se diz amigo, ferir verbalmente sangue do meu sangue? Será por as silhuetas serem idênticas. Sofrem ambas do mesmo mal.
O respeito, a humildade, o estar sempre tudo bem. Se soubesses como me sinto? Como uma andorinha a quem partiram uma asa.
Pois é… Amizade confiante é aquela para todos os instantes, nos momentos de alegrias ou de dor.
Para mostrar amizade não é necessário um banquete na mesa redonda para evidenciar que estamos todos ao mesmo nível, tal Cavaleiros da Távola Redonda. Para mim basta-me um naco de pão oferecido com generosidade e de coração aberto.
Desculpem-me aqueles que estão a ler este desabafo, mas é preciso arejar, estou cansado de ser um palhaço, submisso a esta falsa afeição. Mas as atitudes perduram no tempo. A vida é madrasta e quando menos se espera prega-nos uma partida. É amigo, Ele não dorme.
Agora volto ao meu mundo. Está na hora de ajeitar a noite para que durma de novo o amor pela vida que mesmo paupérrima perdura.
Não quero perder a fé. Não quero perder a esperança, mas resta-me apenas viver com o eco do silêncio a ruir no espaço vazio onde me encontro!
Mas nada foi surpresa… apenas me deixei ir no absinto e na inércia da minha aceitação.




"Devemos comportar-nos com os nossos amigos do mesmo modo que gostaríamos que eles se comportassem connosco"
Autor: Aristóteles

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Elisabete


“Que lindo par!
Ele, belo com essa beleza que distingue o homem; ela, bela com essa beleza que Deus dá só à mulher! Ai! Um sorriso que se desprendesse dos lábios formosos daquela virgem mataria de amores um homem! Um olhar meigo e terno que brilhasse por entre aquelas pestanas aveludadas venceria o mundo!
Naquele tempo da faculdade, Elisabete dançava impreterivelmente todos os domingos. Das sete à meia-noite. Vestido rosa, rabo-de-cavalo, sapato baixinho, ainda. Batom e algumas gotas de perfume francês, roubadas do frasco da mãe.
Naquele tempo, toda noite tinha lua. Com ou sem estrelas. Toda noite era azul e linda. Aos domingos.
O baile começava cedo e ela fingia não notar os olhares insistentes dos rapazes. Dançava displicente com uns e outros. Ar de enfado. Até que, depois do intervalo, ele aparecia. Às dez. Sempre. Como um deus sob a luz negra do salão.
Dançavam até o último segundo, última música. Sempre. Depois, beijo rápido à saída. Quase casto, não fora o calor que lhes subia coxa acima.
A cada domingo, tudo se repetia. Então, um dia, ele não veio. Todas as noites tornaram-se escuras. Sem lua. Para sempre. Nunca mais dançou.
Às vezes, uma lágrima humedecia-lhe o olhar quando ouvia a canção antiga.
Tempos depois, um convívio de final de ano lectivo de alunos e professores. Sorriu ao ouvir a mesma música. Mal acreditou, quando ele a convidou para dançar. Às dez. Como antes. Surgido do nada. Com a lua que, súbito, inundou a noite. Como se nunca houvesse o tempo passado.
Apenas mudou o beijo à saída. O gosto de vida vivida que, para sempre, lhe marcou a boca. Ele tinha casado. O filho era aluno na mesma escola. Nunca mais lhe conheceram namorados a sério após a faculdade. Obviamente nunca casou.”


In: "Asas de borboleta" (Não editado)

sábado, 19 de dezembro de 2009

Parabéns ROSY


"A Traição de Psiquê"





Apenas poderia existir um vencedor e perante a forma como encarou este desafio e por acertar sempre num dos títulos... Tenho o maior prazer em oferecer o exemplar d' A Traição de Psiquê, à minha querida amiga ROSY do blogue

http://versoslivres-rosy.blogspot.com/




Os dois textos seleccionados para a colectânea foram:

Poema dos cinco sentidos
Desespero do só

sábado, 12 de dezembro de 2009

Desafio "A traição de Psiquê"





Para quem gosta de poesia e/ou prosa poética sobre o tema do amor e do erotismo, um exemplar da colectânea "A traição de Psiquê" será oferecido a quem em primeiro lugar acertar nos títulos dos meus dois textos que foram seleccionados e que integram a referida colectânea.


O prazo termina às 00 horas do próximo sábado (dia 19).



sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Os sonhos também se abatem

(...)

Uma névoa cobria o grandioso edifício do hospital. Uma nébula cor de chumbo que irritava os olhos. O calor tornava o ar rarefeito e os pulmões tinham crostas sólidas que tornavam a respiração um inédito trabalho consciente. Era meio-dia e o estio não havia maneira de abandonar a estação do tempo.
Meio-dia e um minuto. Desde madrugada que tinha travado uma contenda contra o tempo. Furtado abandona o hospital e dirige-se para a estação do metro. Esperava como uma raiz apodrecida pelo comboio. Uma menina esboçava um sorriso. Não era uma menina qualquer. Tinha a tez alva, de uma nórdica. Os olhos vítreos de um azul-marinho, encimados por supercílios traçados a lápis de cera. O rosto era ornamentado por maçãs salientes e róseas. Os lábios de Vénus, e um nariz que não saberia definir, mas que possivelmente associou aos das deusas celtas. Da fronte ampla e lisa, emergia uma farta cabeleira azeviche e sedosa, parcialmente presa na nuca. Ela olhava na sua direcção, para o vácuo e sorria. O médico, atónito, tremia. Ignorava o motivo, mas era fácil supor. Nunca uma menina lhe tinha sorrido daquele modo. Nem em sonhos. Nenhuma, jamais o iria certamente fitar com tanta meiguice e carinho quanto aquela menina que parecia uma pétala de poesia.

Acordou a meio da noite com suores frios. Depois da preguiça, espreguiça.
Esticou os braços e tremeu como aqueles que querem não tremer. Gesticulou e fez uma careta alongada ao ritmo de uma breve flatulência. De seguida desfez um Xanax num copo que continha uma réstia de cerveja. Encostou-se na almofada e fechou os olhos. Tudo era negro como breu. Uma espécie de contentamento iluminou o nirvana de ascese moderna.
Todas as imagens eram ficção. Esperava que aquele quadro negro permanecesse eternamente. Pelo menos até ao amanhecer. Assim, não pensaria sequer a dormir. Arrebatado, cego, estático. Não existem introduções para a epifania.
Uma visão não tem prólogo nem epílogo. Simplesmente acontece.
Após algumas horas acordou de novo sem dar conta de si. Deambulou pelas diversas divisões. Nenhuma delas o cativou. Transitava sem posição, apenas e só perspectiva.
Passou pela cozinha. Bebeu água de forma lenta como que saboreando cada trago, cada gesto.
Retornou ao quarto. Pensou um pouco no sonho e não deu muita importância, afinal já estava habituado aqueles sonhos nos quais “ela” sempre agia assim. Simplesmente sorria para o nada.
Voltou para a cama. A imagem da menina deusa girou-lhe de novo nos olhos. Sabia que tinha sonhado. Por vezes um, noutras, vários e em muitas das noites, nenhum.
Fechamos os olhos e a alma dorme noutro lugar. Sonhar é bom. Sonhar é viver, amar, sentir. Mas, os sonhos também se abatem.
(...)


In: A filha que nunca tive

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

A Nobreza na despedida


Esta noite a insónia, o desespero e a desilusão não me largaram um segundo.
A necessidade de respirar a vida ergueu-me do leito bem cedo.
O sol envergonhado conduziu-me até à beira mar.
Há dias assim, em que se pesca e repesca no fundo do baú, na esperança de encontrar qualquer coisa. Não precisa ser valiosa, nem imponente, nem dourada, basta que seja uma qualquer coisa.
Fiz uma retrospectiva da minha vida. Pensei muito. A dor inundou-me. A desilusão agarrou-me com os seus tenazes braços e não me largou.
Vou morrer virgem de tantas coisas, de tantos sentimentos e sensações que nunca provei, que não sei como são. Julgo que tirando a minha mãe ninguém me embalou. É assim, sei que irei morrer, sem provar o sabor da acalmia da mente, da alma, o sabor do verdadeiro amor, sem represálias, sem tiranias, de alguém que se intitula de perfeccionista e única.
Mas que se desengane, porque não o é, não o foi nem será. Que pratica o que condena no outro. Que magoa da mesma forma que todo o ser. Que toma por vezes atitudes certas e as posturas erradas como todos.
Pensei na minha mãe, doente. Meditei no meu pai igualmente enfermo. Para quê tanto ódio se amanhã poderei já não fazer parte dos que me amam ou dos que me desiludem.
Assaltou-me a ideia do amor que tanta gente apregoa sem o praticar.
Se pensarmos na vida, ela é tão curta, para quê ferirmos o coração? Para que nos serve destroçarmos a alma de alguém que dizemos amar?
Será que vale a pena? Seremos eternos?
Afinal vingança é sinónimo de amor?
Se o destino existe mesmo, ele que me aniquile e me faça renascer noutra vida, e essa outra que virá um dia que me ofereça a paz de espírito, sem assombros de fantasmas da infância, sem o peso de todos as responsabilidades e principalmente sem esta lucidez que, como um espelho gigante e multifacetado, me mostra clara e nitidamente os meus erros, omissões e faltas. Tenho saudades do que não conheço, mas que revejo na vida dos outros. Afinal errar é humano… e não é apenas um que falha…
Tenho pena desta minha existência, desta passagem pela vida, tão imperfeita. irónico é que, desde que me lembro de ser gente, sonhei com esse colo, esse abraço protector, esse escudo contra os desgostos ridículos e as amarguras de lágrimas de raiva e sangue. Sonhei-o sempre. Nada de especial, nada de fantástico. Apenas alguém capaz de me amar como sou, que saiba quem sou. Que me ouse conhecer para além do óbvio e de me cuidar, como um livro antigo ou uma peça sem outro valor senão o da saudade.
Se é o fim, que seja, mas que seja com honestidade, com a nobreza que ambos merecemos.


7-12-2009

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Mulher! Sei que sou a última pétala da tua flor...


Mulher! És Febe deusa da lua, diva de mistérios e segredos.
Mulher bela com os seios nus, voando pelo céu e levando numa das mãos um cântaro de prata.
Anseio pelo dia que possa contigo voar pelo firmamento. Beijar teus lábios entre o brilho da lua histérica repleta de fascinação, que risca o céu, desvirginando as madrugadas.
Mulher! Nunca percebi muito bem o porquê dos teus números ímpares, se o teu nome é par.
Tudo em ti é impar. Único e indivisível.
De duas belas e sublimes flores que te entreguei escolheste apenas uma.
Um Malmequer. Começaste de forma ronceira o jogo cândido de o desfolhar na minha frente. Mal me quer. Bem me quer. Mal me quer.
Eu sorvia cada uma das tuas palavras tornadas pétalas e permanecia expectante pelo teu desfecho.
Aliás o meu desfecho em ti. Mas tu não me permitiste entender.
Mal me quer foi, certamente, a última das pétalas que arrancaste.
Eu fui, sem dúvida, a última pétala que arrebataste.


2008