Uma névoa cobria o grandioso edifício do hospital. Uma nébula cor de chumbo que irritava os olhos. O calor tornava o ar rarefeito e os pulmões tinham crostas sólidas que tornavam a respiração um inédito trabalho consciente. Era meio-dia e o estio não havia maneira de abandonar a estação do tempo.
Meio-dia e um minuto. Desde madrugada que tinha travado uma contenda contra o tempo. Furtado abandona o hospital e dirige-se para a estação do metro. Esperava como uma raiz apodrecida pelo comboio. Uma menina esboçava um sorriso. Não era uma menina qualquer. Tinha a tez alva, de uma nórdica. Os olhos vítreos de um azul-marinho, encimados por supercílios traçados a lápis de cera. O rosto era ornamentado por maçãs salientes e róseas. Os lábios de Vénus, e um nariz que não saberia definir, mas que possivelmente associou aos das deusas celtas. Da fronte ampla e lisa, emergia uma farta cabeleira azeviche e sedosa, parcialmente presa na nuca. Ela olhava na sua direcção, para o vácuo e sorria. O médico, atónito, tremia. Ignorava o motivo, mas era fácil supor. Nunca uma menina lhe tinha sorrido daquele modo. Nem em sonhos. Nenhuma, jamais o iria certamente fitar com tanta meiguice e carinho quanto aquela menina que parecia uma pétala de poesia.
Acordou a meio da noite com suores frios. Depois da preguiça, espreguiça.
Esticou os braços e tremeu como aqueles que querem não tremer. Gesticulou e fez uma careta alongada ao ritmo de uma breve flatulência. De seguida desfez um Xanax num copo que continha uma réstia de cerveja. Encostou-se na almofada e fechou os olhos. Tudo era negro como breu. Uma espécie de contentamento iluminou o nirvana de ascese moderna.
Todas as imagens eram ficção. Esperava que aquele quadro negro permanecesse eternamente. Pelo menos até ao amanhecer. Assim, não pensaria sequer a dormir. Arrebatado, cego, estático. Não existem introduções para a epifania.
Uma visão não tem prólogo nem epílogo. Simplesmente acontece.
Após algumas horas acordou de novo sem dar conta de si. Deambulou pelas diversas divisões. Nenhuma delas o cativou. Transitava sem posição, apenas e só perspectiva.
Passou pela cozinha. Bebeu água de forma lenta como que saboreando cada trago, cada gesto.
Retornou ao quarto. Pensou um pouco no sonho e não deu muita importância, afinal já estava habituado aqueles sonhos nos quais “ela” sempre agia assim. Simplesmente sorria para o nada.
Voltou para a cama. A imagem da menina deusa girou-lhe de novo nos olhos. Sabia que tinha sonhado. Por vezes um, noutras, vários e em muitas das noites, nenhum.
Fechamos os olhos e a alma dorme noutro lugar. Sonhar é bom. Sonhar é viver, amar, sentir. Mas, os sonhos também se abatem.
Meio-dia e um minuto. Desde madrugada que tinha travado uma contenda contra o tempo. Furtado abandona o hospital e dirige-se para a estação do metro. Esperava como uma raiz apodrecida pelo comboio. Uma menina esboçava um sorriso. Não era uma menina qualquer. Tinha a tez alva, de uma nórdica. Os olhos vítreos de um azul-marinho, encimados por supercílios traçados a lápis de cera. O rosto era ornamentado por maçãs salientes e róseas. Os lábios de Vénus, e um nariz que não saberia definir, mas que possivelmente associou aos das deusas celtas. Da fronte ampla e lisa, emergia uma farta cabeleira azeviche e sedosa, parcialmente presa na nuca. Ela olhava na sua direcção, para o vácuo e sorria. O médico, atónito, tremia. Ignorava o motivo, mas era fácil supor. Nunca uma menina lhe tinha sorrido daquele modo. Nem em sonhos. Nenhuma, jamais o iria certamente fitar com tanta meiguice e carinho quanto aquela menina que parecia uma pétala de poesia.
Acordou a meio da noite com suores frios. Depois da preguiça, espreguiça.
Esticou os braços e tremeu como aqueles que querem não tremer. Gesticulou e fez uma careta alongada ao ritmo de uma breve flatulência. De seguida desfez um Xanax num copo que continha uma réstia de cerveja. Encostou-se na almofada e fechou os olhos. Tudo era negro como breu. Uma espécie de contentamento iluminou o nirvana de ascese moderna.
Todas as imagens eram ficção. Esperava que aquele quadro negro permanecesse eternamente. Pelo menos até ao amanhecer. Assim, não pensaria sequer a dormir. Arrebatado, cego, estático. Não existem introduções para a epifania.
Uma visão não tem prólogo nem epílogo. Simplesmente acontece.
Após algumas horas acordou de novo sem dar conta de si. Deambulou pelas diversas divisões. Nenhuma delas o cativou. Transitava sem posição, apenas e só perspectiva.
Passou pela cozinha. Bebeu água de forma lenta como que saboreando cada trago, cada gesto.
Retornou ao quarto. Pensou um pouco no sonho e não deu muita importância, afinal já estava habituado aqueles sonhos nos quais “ela” sempre agia assim. Simplesmente sorria para o nada.
Voltou para a cama. A imagem da menina deusa girou-lhe de novo nos olhos. Sabia que tinha sonhado. Por vezes um, noutras, vários e em muitas das noites, nenhum.
Fechamos os olhos e a alma dorme noutro lugar. Sonhar é bom. Sonhar é viver, amar, sentir. Mas, os sonhos também se abatem.
(...)
In: A filha que nunca tive
7 comentários:
Está um lindo texto!!
;)
A Cada pedaço deste livro, dá mais curiosidade de o poder ter e ler...
Fico á espera da sua publicaçao!
beijinhos
Hoje é sexta, então sorria!!
E tenha um fds abençoado
bjsss
O sentimental, sem dúvida alguma :x
Rosy
assim pensem as editoras.
Obrigado pelas sempre doces palavras. A questão que me coloca sobre o livro está no comentário ao seu texto.
Dri Viarro,
obrigado e um santo fds igualmente para si.
bjo
Sophia,
que dizer... sim sou um sentimental, e inveterado... mas julgo já não ter cura.
Querida luz,
obrigado do fundo do coração pelo teu comentário.
O sonho comanda a vida. Eu sonho, mas os meus sonhos são a preto e branco.
Será esse o motivo pelo qual não se realizam?
Um enorme beijo
Se calhar sempre as foram...
Que importa isso agora?
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