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domingo, 29 de novembro de 2009

“…uns tocam-nos o corpo sem nunca nos terem tocado a alma... e outros tocam-nos a alma sem nunca nos terem tocado o corpo..."

Neste lugar, as árvores são objectos de Van Gogh.
Fico longos momentos ao sol, para as ver retorcer, bater, suplicarem e chorarem sob os ataques de vento.
Levantei-me cedo e tentei encontrar Igor. Nem a sua sombra.
Agora só um café. Sem a cafeína matinal sentia-me um tronco inanimado, sem vontade própria, sem reacção.
Fui a pé. Sem pressas e tentando encarnar na minha mente a percepção do malogrado pintor.
Tento-o muitas vezes. Quando o consigo, vejo o mundo a cores.
Toda a gama dos azuis. Azul lavanda do céu, azul-marinho do mar e o azul mais deleitoso do horizonte.
Os verdes. Prateado das oliveiras, pouco mais escuro, como o das videiras, mais escuro ainda das moitas de mato.
Os brancos, reflectidos em cada casa da povoação, tanto à sombra como ao sol.
A gama dos ocres, o avermelhado dos telhados, ocre beige da igreja, ocre quase castanho de um pedaço de terra a meus pés.
Mas, curiosamente tenho medo das telas e até dos espelhos. Olho para as portas com desconfiança, julgando-as capazes de se fecharem brutalmente atrás de mim para não mais se abrirem.
É urgente que eu vá até à povoação e ao café, para me libertar desta angústia. Soltar-me do lado escuro da lua.
É necessário que eu desça de onde estou, correr apesar do vento que de forma matreira me tenta travar, que se enfurece de me deixar passar.
Recordo-me que no Verão passado Amélia estava junto à porta do café com Sofia, a mulher do meu amigo Filipe. Aliás foi através dele que ficara a conhecer como a palma das minhas mãos a vila.
Eu apaixonado pela mulher de Filipe como um garoto. Mas, impossível encenar com ela o jogo, cem vezes repetido da sedução.
Paralisado pela sua beleza, pelo seu humor e segurança. Eu pensava que as coisas por vezes são assim. Sonhar pelo menos uma vez com amor, em vez de o fazer. Entender o que uma vez li algures; “…uns tocam-nos o corpo sem nunca nos terem tocado a alma... e outros tocam-nos a alma sem nunca nos terem tocado o corpo..."


In: O lado escuro da lua (Não editado)

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Teatro da vida

Reconheço que sempre estive sentado na margem errada do rio, na beira desacertada da vida.
Naquele lado cinzento que pronuncia tempestades de ilusão.
Não há vontade de partir.
Não há vontade de ficar.
Vou fazendo horas. Metade da vida é uma perdulária expectativa, tonta, ansiosa e inútil.
Tal como um espectro que se senta numa gare de caminho-de-ferro, à espera de um comboio que não se sabe quando passará e qual o seu destino. Certeza, apenas a visão trémula dos carris que parecem fundir-se num só.
Certeza absoluta, apenas o local de espera e às vezes a própria espera.
Vê o que temos feito de nós… Essencialmente, não temos amado. Não aceitamos o que não entendemos porque não queremos. Com que fim?
Temos amontoado a alma de coisas, coisas e coisas, mas não nos temos um ao outro. Que objectivo?
Apenas vamos construído catedrais, e ficando do lado de fora. Talvez, porque as catedrais que nós mesmos construímos, podem vir a ser armadilhas. Ultimamente, não temos usado a palavra amor para não termos de reconhecer a sua cércea de ódio, de ciúme e de contradições.
Temos disfarçado com o pequeno medo, o medo maior, e por isso nunca falamos o que realmente importa.
Temos chamado de fraqueza a nossa candura.
Eu sei que o meu mundo nunca foi azul celestial, nem a minha vida foi colorida como o arco-íris que ressuscita nas alturas.
No alto e por breves momentos, consigo ver-te, relembro o beijo de ardor, o abraço da alma, e todos os momentos que envolveram dois seres sedentos de amor e carinho.
Disse a mim mesmo que não chorava mais, mas não.
A minha dor está lá e não consigo dilui-la doutro jeito. Começo a chorar. No coração está presente a ferida de uma criança crescida embebida num homem imberbe... tenho medo!
Estarei sempre na espera de um toque suave no meu ombro, um abraço apertado e um beijo intenso. Lembras-te? Eu recordo aquele toque dos teus dedos na minha mão sedenta do teu amor. Sinto-os a percorrem-me os sulcos da espinha até chegar ao meu cérebro, sinto o meu corpo arrepiado transpirando de prazer. Sinto-te. O teu prazer também se intensifica e aqui estamos nós mais uma vez no enorme palco vazio de endereços, de público, sem a presença de um encenador que nos possa conduzir ao perfeito diálogo.
Sim, sei que já fomos assaltados várias vezes pelas pancadas de Moliére, mas nenhum de nós quis o papel principal.
Mas, ambos sabemos que este drama estará em cena até ao fim dos nossos dias.
Relembro o derradeiro diálogo da peça, uma encenação da nossa tríade da vida.
“Como eu te quero.” Digo em sussurro.
A lua ilumina o teu rosto, os teus olhos negros brilham de novo.
“Como eu esperei por este dia!” Exclamas.
O meu sorriso volta.
“Estou aqui contigo.”
“Tu estás aqui comigo?”
“Sim…”
“Então, derrama o teu sabor em mim.”
“Porquê?”
“Quero deslizar sobre o teu corpo delirante de paixão, como uma patinadora de dança num lago gelado!”

Novembro/2009

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Metáfora da liberdade



O tempo. Simultaneamente, inimigo e aliado.
Enquanto nos sorve a vida pelas beiradas, repara os estragos que ela causou no nosso âmago. Com o passar do tempo percebemos que um simples sorriso faz a diferença. Um simples abraço transforma segundos em longos minutos. Que o som de uma guitarra nos remete a outro mundo. Que estar só requer um equilíbrio emocional. Entendemos o real valor das pessoas, que todas são diferentes. Criamos novas expectativas. Queremos andar sozinhos, mas não queremos estar sós. Essencialmente com o passar do tempo aprendemos que o tempo passou mas não em vão. E, para mim, o tempo tinha sido um adversário difícil de combater. Se tinha.
Lembro-me muito bem de como era ser criança. O tempo era infinito e não havia morte. Nem sequer nela pensávamos. Passávamos-lhe sempre ao lado com a nossa inocência e vivacidade. “Só os velhos morrem.”
O mundo era uma imensidão. O relvado da escola primária parecia uma imensa pradaria americana. Os espaços pareciam tão imensos que nos perdíamos na nossa casa.
Os jogadores de futebol pareciam uns homens feitos, velhos. As miúdas dos concursos moldavam os fatos de banho a preto e branco como mulheres sensuais e com ar escanado.
As férias grandes eram mesmo grandes e no fim das mesmas tínhamos dado um “pulo” imenso, pelo menos era o que os adultos nos diziam. As emoções ainda eram grandes demais para nós, por isso submergiam-nos. A nossa casa era um claustro, de tecto alto e inatingível.
Tudo era possível. Os adultos tinham todas as respostas, por isso a nossa própria ignorância não nos afligia muito. Pensar? Apenas nas participativas corridas de caricas que tinham lugar no lancil dos passeios, ou nos jogos de hóquei em sapatilhas com uma bola de matraquilhos que com o “estique” lançávamos contra as sarjetas.
Deus era uma certeza. Estava em todo o lado. Olhava por nós.
Mas o tempo não perdoa e quando acordamos vimos por cima do ombro, o passado tão perto, que por vezes o queremos agarrar.
Como uma metáfora da liberdade, atirar-me apanhar uma gaivota e voar por aí sobre os mares, sem rumo, esquecer quem sou e o tempo que não tenho, esquecer as lágrimas perdidas e no cimo da vida pular de contentamento, esquecer os pensamentos ensanguentados e ser eu próprio assim como nunca fui nas asas de uma gaivota.
Queria eu vencer as batalhas todas de seguida, numa rajada inspirar o amor que sinto não existir no coração dos outros e como se eu fosse genuíno, mais puro do que as águas cristalinas como as que jorram de escusas cascatas, ver reflectidos em mim os sonhos deles sem pontas de ódio ou de ruptura... só e apenas assim ser nas asas de uma gaivota.
Cala-te boca! Cala lá todas estas palavras porque hoje a loucura é muita e a febre de me sentir vence, porque hoje a vontade de ir me surpreende. Tomara eu ser Fernão Capelo e voaria sempre ávido de liberdade desafiando as regras impostas por gente que se julga dona do mundo e alertando-os a abrir os olhos para a liberdade que só o conhecimento pode trazer.
Entretanto, assim como Fernão Capelo Gaivota, acredito que somos ideias perfeitas e ilimitadas de liberdade, porque o perfeito vem da busca infinita pelo melhor.
"Para as pessoas que sabem que a vida é algo mais do que aquilo que nossos olhos vêem.”



In "A filha que nunca tive"

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Fragmentos


Há quanto tempo a cadeira ficou vazia? Não sei, mas o teu lugar permanece por ocupar!
Lembro-me com saudade daqueles caíres de tarde em que com o olhar de anjo agreste me inquirias o que estava a ler.
Se eu pudesse ter prendido esse olhar ao meu, certamente a cadeira continuaria ocupada, a mesa de madeira estaria ainda decorada pelo teu cabelo encaracolado de negro.
Cinquenta anos nos ombros e ainda tenho receio de decidir. Irei necessitar de mais outro meio século, até eu embarcar na derradeira carruagem e hesitarei sempre.
Eu andava numa de literatura russa. Manias dos anos setenta. Acordava com a noite ainda a descansar no seu leito ficcional de etéreas reminiscências.
Na ligeireza da velocidade da luz engolia metade de uma banana, bebia um copo de leite e num som abafado bocejava deixando sair o aperto da saudade sentida durante a noite.
As portas da biblioteca escancaravam-se às nove da manhã e não queria perder a cadeira habitual, o odor, o ritual de sempre.
Sentado na mesa de madeira transversal à estante, sentia-me o monarca dos livros. A leitura sempre cativante fazia-me perder o mundo exterior, trocando-o pela vida cravada nas folhas de papel dos clássicos.
Portanto, deixei-me desvanecer dos propósitos sociais da vida, e unha com carne percorria a lombada poeirenta dos livros expostos à espera que os avivassem.
Comia um pedaço de pão, nunca desviando uma nesga a atenção das páginas pálidas de tão amarelas.
No dia seguinte o ciclo recomeçava. Um dia ela apareceu escondida debaixo dos óculos de massa pretos. Acariciava os livros com mãos delicadas, roçava-as nas capas dos romances.
Levantava-se a meu lado, bocejava com os braços em arco esticava a coluna, arregalava os olhos para mim, como se eu fosse inverosímil, um invento novo, ou o personagem de uma vida refundida.
Passaram alguns dias e a formalidade mantinha-se.
Não me precipitei. Um dia, ao fechar o último livro tomei-a nos braços como impressa e editada para mim.
Acariciei-lhe os lábios, a face e a minha boca tocou a sua com a suavidade estonteante do secretismo.
Afinal de contas, apenas tínhamos, Dostoiesvski, Tolstói, e o resto dos sábios como testemunhas.
Presentemente, as provas são os espectros do meu passado.
Agosto/2007

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Ensaio sobre o suicídio

«Depois, também sofri muito de amor e o sofrimento por amor é um sofrimento físico. Daniel falava-me de um dos seus pacientes adolescentes que tinha uma depressão muito grande e o rapaz dizia-lhe: “Olhe, gostaria de ter danificado um órgão para que me doesse só esse órgão, porque com a depressão dói tudo.” É assim o sofrimento por amor, dói tudo. É horrível. Esse foi um conhecimento da dor muito, muito grande».

[Conversas de António Lobo Antunes - Maria Luisa Blanco]


Existem tantas pontes, que por vezes fico parado a olhar para cada uma delas de olhos arregalados, às diversas possibilidades, e fico errante a pensar em cada uma delas. Fundamental é que nos chamem de longe para um, ou para o outro lado, alertando-nos para o labirinto inventado. O pior de tudo é que ninguém me evocou.
Não sei qual será a decisão que Ele irá ter comigo. Eventualmente não me permitirá pegar de novo na caixa rosa, ou poderá trocar a cor da caixa enganando-me, tal como os outros o fazem, e tal como eu me tenho enganado a mim próprio.






A minha vida está estraçalhada como as nuvens baixas que são empurradas pelos ventos fortes do inverno. Não é possível ainda enxergar ao longe, mas creio que não há muito que fazer, a não ser seguir em frente.
O que gostava era poder avançar no trilho da vida com uma das mãos protegendo os olhos, e a outra, agarrada aos amigos.
Até está um dia bonito: chuva fina, nuvens, ar de Outono e um passarinho que implica com alguma coisa invisível ali adiante do fio de alta tensão.
A minha mente vagueia freneticamente pelos meandros sujos e estreitos corredores da depressão, já há algum tempo.
A noite serve de albergue à minha pobre alma. No escuro vejo a realidade. Na negrura da noite reconheço que tudo findou.
Fui feliz, fui Homem, fui amado, amei e amo alguém que ainda não me conhece. Alguém que me confunde, inebriada por embustes da destruição.
Queria ter conseguido explicar-te por gestos virtuosos que não são apenas só os ratos que vagueiam nos túneis escuros, onde o cheiro nauseabundo mostra a decadência que somos.
A saudade inunda-me de dor. Porque mudou, o que mudou?
Quem te fez alterar a doçura do olhar e trocá-la pelo azedume do confronto.
Porque me abates por constrangimento de uma inquisição de uma máscara do degredo.
Sinto-me esgotado, nauseado, fragilizado e farto desta azáfama que acompanha a realidade dos dias, sempre repetitivos, exaustivamente vazios.
Estou exausto pela briga de palavras sem fim, que destruíram o que de belo existia.
Agarras-te aos meus parcos cabelos e segues viagem comigo?
Aqui na terra nada tem sentido!
A única solidariedade que se recebe dos outros é ignorância e o desprezo. E a vida é tão curta e célere. Porquê tanto amor desfeito em mágoa?
Quem sabe se encontraríamos a felicidade, o tal amor que apregoas, que escreves e que revelas com tanto enleio.
Mas, apenas as moscas que me bebem as lágrimas me fazem sentir que ainda tenho uma réstia de vida.
A embalagem era extremamente apelativa. Não sei se era a cor rosada que emanava e me feria os olhos esbugalhados por mais uma noite de insónia, ou se o rótulo meio desfeito onde apenas sobressaia umas letras desfocadas onde se conseguia ler, “Manter fora do alcance de crianças”. Estava ali à minha disposição; em cima da mesinha de cabeceira. Era apenas uma caixinha que ela usava para ter à mão os comprimidos que a faziam dormir. Nunca liguei qualquer importância ao valor daquela caixinha e, no entanto, ela continha o passaporte para uma viagem sem retorno, apenas de ida.
Irei levar algumas rosas, alecrim, para que o seu perfume e o sentido da Primavera perdurem.
É lá que me quero refugiar.
Nunca tinha pensado nisso, excepto aquela noite. Uma noite em que acabara de chegar de mais um dia de trabalhos forçados. Comi uma maça para poder ingerir um bom pedaço de álcool para me aquecer a alma tão fria e tão dormente que já nem a sentia. E eu que nem prezo álcool.
Também, para que queria eu uma alma? Que é que ela me dá ou me faz?
Julgo que é daqueles dias, em que não devia ter nascido!
A caixinha rosa continuava ali. Quantos comprimidos teria ela deixado?
A minha mão direita estendeu-se tremulamente para aquela caixinha tão apelativa e consoladora pelo imaginário que já me estava a provocar.
Não custaria nada e dormiria para sempre; tão bom. Era disso que eu estava a precisar ou seria de mais um pouco de tinto?
Estava só. Levantei-me e fui ver a panóplia de garrafas que tinha no bar em perfeito alinhamento, porque nunca tinha desfeito a parada.
Mas para tomar os comprimidos eu precisava de beber alguma coisa e essa coisa estava também ali à mão. Peguei numa ao acaso, afinal tudo me sabia a fel, tal como a vida. Mirei-a de alto a baixo e verifiquei que já tinha sido aberta. Talvez no século anterior. Época em que ainda alguns confrades apareciam cá por casa.
Teria ainda algum líquido? O suficiente para engolir os comprimidos? Já não tinha forças para me levantar novamente e ir buscar outra garrafa.
A caixinha rosa choque continuava ali e a minha mão já estava em cima dela.
Senti-lhe a textura sob os meus trémulos dedos e senti-a fria.
Se me agarrar com a força necessária a essa caixa rosa ficarei lá em cima, sim… onde o horizonte se confunde com o rendilhado das nuvens que parecem fugir de algum sarilho também.
Um arrepio percorreu-me a espinha; ou teria sido outro tipo de arrepio? Não sei quanto tempo estive com aquela caixinha na mão. Não sei quanto tempo demorei a tomar uma decisão. Não sei quanto tempo a olhei com um olhar turvo e abstracto.
Não sei por que razão, não lhe peguei com a decisão com que me propusera.
Dei por mim a olhar para aquele objecto sem saber para que é que servia e naquele momento, apenas me apeteceu dormir.
Afinal, tão perto do derradeiro sono; tão desejado; ali tão à mão.
Reparei então que estava deitado sobre o lugar dela com o braço direito estendido para a mesinha de cabeceira segurando a caixinha rosa que continha o passaporte para a derradeira viagem. Tantas vezes assim estivemos.
Quantas vezes senti o seu calor, o seu respirar, o seu arfar. Tantas vezes assim fiquei depois de fazer amor. E, neste estúpido momento, repetia aquela posição estendendo a minha mão para uma viagem. Não consegui conter o choro; não consegui aguentar as lágrimas; não consegui segurar a caixinha rosa. Não consegui partir.
Restou-me a certeza que as noites serão de um frio impotente. Que os dias serão certamente mais despidos de roupagem florida e cobertos de mágoa, dor e muita lágrima.
Se é para enlouquecer, quero dar em louco nas nuvens!

Nota: Por motivos pessoais terei de fazer uma pausa nos meus blogues.

Regressarei assim que me for possível.

A quem me tem acompanhado o meu obrigado.

sábado, 14 de novembro de 2009

Homem de cinquenta...

(Este texto pretende ser uma sátira aos homens de cinquenta… pronto! Como eu. É uma adaptação de um excerto do livro Ano Louco, e pretendo com ele dar a conhecer uma faceta mais prosaica do Sonhadoremfulltime… Divirtam-se, se for esse o caso…)



Todas as sextas-feiras tento a sorte que meio mundo anseia… o Euromilhões. Sabem porquê?
Porque quando somos ricos podemos tratar muito melhor do nosso aspecto. E eu estou na idade apropriada para o fazer.
Vejam os retoques que esse pessoal de Hollywood protagoniza além das películas em que participa.
Embora a grande maioria ainda nem se abeire dos quarenta, mas quem tem “money”, tem tudo.
A partir dos cinquenta anos, começamos a sentir o peso da idade, ou seja, começamos a procurar sinais da idade.
Até lá um tipo não tem idade, é simplesmente novo, alegremente sem idade, nem sequer sabe o que é isso da idade.
Depois, bem depois, quando dá por isso, apercebe-se que já não pode renovar o cartão jovem, é confrontado com o facto de que afinal já começa a ter idade.
Diz-se que a primeira crise, começa com a ternura dos quarenta. Começamos com aquele saborzinho diferente, o da descoberta, o da procura dos sinais e efeitos da idade, espécie de obsessão genética.
O problema é que em mim são difíceis de encontrar esses sinais e ainda mais os efeitos, é verdade! Acreditem… percorro o corpo em busca de sulcos, mas não encontro. Pelo menos não os vislumbro, nem os apalpo.
Claro que visto de cima, pareço-me cada vez mais com o Santo António, mas tento nunca me baixar na presença feminina para que não me descubram a careca. Depois também nunca fui de fazer parar o trânsito e tirando aqueles detalhes fisionómicos, algumas proeminências na zona abdominal de ténue importância, não encontro nada de verdadeiramente significativo.
Não ocorre em mim neste momento nenhum processo de degradação física ou intelectual visível, qualquer sintoma de senilidade mental... o que é que eu estava a falar mesmo?
Ah, a única alteração que ocorreu em mim, foi de um momento para o outro julgar que tenho as bainhas da maioria das minhas calças subidas de mais.
Deixei de suportar andar com a boca das calças a dançarem-se-me nas canelas quando ando.
Quando aperto o passo o efeito ainda agrava. Fui eu que cresci? Será que ainda estou a crescer?
A partir de agora a calça tem que roçar o chão sem lhe tocar, sem que, no entanto não esconda a marca da meia quando cruzar as pernas. Fundamental!
Confesso que ainda não dou mais valor ao interior que ao exterior duma gaja, mas talvez para me redimir, passei a dar mais valor à minha roupa interior que exterior.
De marca, impreterivelmente, tenho actualmente um invejável stock de meias e cuecas tipo boxer, justinhas e de excelente qualidade.
Que melhor sinal dos cinquenta que este! Também devo dizer de outra alteração significativa...
Passei a dar importância ao barulho que os sapatos fazem quando ando.
É verdade, o que este gajo se lembra!
Insisto com a elegante mania de só usar sapatos pretos com atacadores, mas a sola e o tacão ganharam significados completamente novos para mim.
De modo que naturalmente numa próxima visita à sapataria, levarei em conta tais pormenores e pedirei à empregada que me deixe medi-los antes de ensaiar o andar em diversos tipos de solo.
Se virem alguém experimentar sapatos nos canteiros das plantas, teste de som em solo arenoso, muito provavelmente serei eu.
Se usar boxers Calvin Klein, então serei eu de certeza absoluta.
De resto, cabelos brancos, alguns, calos nos pés, alguns (nos quintos pododactilos… julgo que é assim que se chamam os mindinhos dos pés).
Estou, como diria o “Hermano”, melhor que nunca e não fui acusado de pedofilia, de cheirar mal dos pés, de não ter declarado todos os meus desastrosos negócios bolsistas no IRS e não tenho ninguém atrás de mim exigindo-me uma pensão de alimentos.
Sinto-me em forma e comecei a beber dois litros de água com chá da Herbalife por dia no trabalho, outro sinal da idade, mas também resultado das leituras fugazes que faço da Mens Health, (onde ainda tento descobrir a Sylvia Kristel, do meu tempo) por acaso outro sinal da idade.
Vivo num meio-termo nirvânico, conseguindo por um lado pagar as contas triviais, água, luz, aspirinas, ir ao cinema quando o rei faz anos... e pouco mais.
Cadeias de fast-food, moderadamente, mas por outro não consigo chegar a um Smart Roadster e ter uma casa com uma vista deslumbrante para o mar nas Açoteias...
Bom! Também não terei desgastes nem aborrecimentos.
Passados uns aninhos, muitos aninhos lá para a frente, uma miúda do liceu irá confundir-me com o namorado com quem acabou ontem. É que os seus namoros nunca resultaram com miúdos mais novos que ela.
Os meus amigos esquecidos da escola primária vão reconhecer-me e à saída de um restaurante imediatamente perguntar-me-ão:
- Desculpe, penso que andei com o seu pai na escola...
Jamais terei umas rugas de expressão (idade, velhice) como o Jack Nicholson.
Que idade terá o tipo?
Já terá passado dos cinquenta?
O homem é um galã, logo nunca deve passar dos trintas e tal.
Não! Esperem lá. Eu assisti ao “Voando sobre um ninho de cucos”, na estreia do filme em Portugal.
Esperem… estou a fazer as contas… afinal o tipo já tem setenta e dois…
Afinal ainda sou um jovem…

Texto: Ano Louco

Foto: Google

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Ajuda-me!



Apetece-me gritar, hoje. Rasgar a garganta em sustenidos de dor.
Não me perguntem as razões, não me perguntem nada.
A letargia em que me encontro prende-me as pernas, amarra-me o coração, acorrenta-me o corpo.
Quero libertar-me, voar sem rumo, agarrar-me às asas de uma gaivota e em cuidado altaneiro sobrevoar o teu corpo composto por grãos de areia que se esvaem na impotência das minhas mãos.
Quero refrescar o corpo e alma nas ondas geladas do mar revolto e de seguida descansar sobre a areia morna do teu corpo.
Precisava de ti neste momento a olhar comigo para o vácuo, mesmo que permanecêssemos no silêncio dos afectos inconfessáveis!
Dá-me a tua mão e agarra-me com a força do vento que verga o pinheiro bravo.
Mostra-me que a amizade é muito mais que uma palavra, que não passa apenas de uma miragem sem retorno. A tua, eu tenho, e a dos outros?
Amizade! Palavra mágica que está a morrer a extinguir-se como a chama de uma vela acabada.
Diz-me através dos teus olhos negros onde estão os meus amigos. Os meus já não vêem, estão cegos pela escuridão que me assola a alma.
Já não vislumbro sorrisos forçados, já não oiço vozes falsas que me querem dizer a verdade.
Quero fugir dos lábios que me beijam, que me tocam a pele da face, com uma carícia forçada e enganosa.
Oiço o grito da minha própria voz e não o reconheço. Quero abandonar o mundo da perfídia e do misantropismo.
Vou preparar a partida. Algumas peças de roupa, e não vou esquecer de levar um pouco da lua na balbúrdia da minha mala. Não irei esquecer de num cantinho levar um pedaço de ti.
Será esse fragmento teu que me irá amparar, e envolver-me num véu transparente de verdade e encher-me o peito desguarnecido de alento.
Não, não quero ficar. Não quero pensar… mas não consigo deixar de o fazer.
Eu quero, mas nada faço para me ajudar e apenas escrevendo me consigo calar.
Porque nos escondemos em tanta contradição?
Os afectos deturpam-se, interrompem-se à mínima contrariedade.
Se é assim onde está a autenticidade?
Que realidade é esta? O desassossego que me acompanha, dia após dia, tem o mesmo sabor da atrocidade que se comete a cada momento em que fingimos, que nada vemos, que nada sentimos, que nada fazemos.
Ajuda-me a irradiar o que de pérfido está no mundo, e porventura em mim.
Age ligeira porque as lágrimas rolam, uma após outra e queimam-me a face de saudade, raiva, tristeza, dor, amor. Sim, amor também faz sofrer.
Deixa correr este rio que há tanto tempo acorrento, que se quer soltar e ir desaguar ao teu regaço.
A modorra fez-me perder a asa da gaivota que me iria levar até ti. Não irei jamais contemplar o teu corpo de areia, escutar o teu sorriso, o paladar da chama dos teus olhos, nem ver o colorido da tua voz quando me chama.
Neste momento, com o breu que me tinge a alma, apenas me poderei agarrar ao patágio de um qualquer morcego até que este me largue em qualquer algar escuro e pérfido tal troglóbio onde possa depositar o meu corpo na vertical, tal como a minha consciência.
Ajuda-me a ser eu!

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

As saudades que eu tenho de ter saudades


Queria conseguir arranjar verbos para o que sinto neste momento, mas as palavras, como eu e tu, não se juntam para formarem as frases que desejo, como eu e tu, que não queremos moldar o desejo em palavras.
E é embrenhado nesta saudade infinita que mergulho o meu corpo e o desejo de te abraçar.
Abraçando sentimentos jamais extintos.
Quero tanto recordar! Quero tanto acariciar a saudade de momentos vividos, instantes belos trocados e sentidos em noites de chuva, mas sempre iluminados pela presença da fase da lua.
A lua alterou de fase mordida pela sombra do sol, enquanto nós alterámos de faces mutilados pelas garras da obtusidade.
Chove! Neste fim de tarde. As gotas ensopadas de dor invadem a minha alma de saudade. E, nesta hibernante nostalgia recordo momentos de amor, instantes de mim em ti.
De coração rasgado, olhos encharcados, não sei se de lágrimas, ou pela chuva molhados, devoro o teu corpo em minha mente.
Uso o meu corpo débil que há muito entrou em erupção, derramando magma incandescente sobre uma alma demente e delirante.
Mesmo magoado, torturado, cansado e abandonado pelo acaso serás sempre a chama viva que meu peito acolhe num corpo enfeitiçado, como um prisioneiro seduzido entre a loucura e a paixão.
As saudades que eu tenho de ter saudades.

sábado, 7 de novembro de 2009

Dont't leave me now - Supertramp

(Uma das minhas músicas... )


Don't leave me now
Leave me out in the pouring rain
With my back against the wall
Don't leave me now
Don't leave me now
Leave me out with nowhere to go
As the shadows start to fall
Don't leave me now
Don't leave me now
Leave me out on this lonely road
As the wind begins to howl
Don't leave me now
Don't leave me now
All alone in this darkest night
Feeling old and cold and grey
Don't leave me now
Don't leave me now
Leave me holding an empty heart
As the curtain starts to fall
Don't leave me now
Don't leave me now
All alone in this crazy world
When I'm old and cold and grey and time is gone...

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Demência...

(...)

Beto era um parceiro de longa data. Companheiro desde a escola primária. Era um quarentão exuberante, um lunático de charme.
Possuidor de uma ostentação desmedida era um homem da tela.
Apesar do hedonismo, apenas tinha entrado em películas, hard-core. Tínhamos passado imensas férias juntos.
Um escritor frustrado e um actor que era conhecido, pela ostentação e tamanho do pénis, é sem dúvida, uma simbiose perfeita.
Igor por sua vez lembra-me de algumas façanhas vividas com Beto. Tem uma memória de elefante.
Tanto lugar pacífico e ignorado, abruptamente abrasado, revolucionado pela nossa louca fúria.
Vítimas incontáveis e ridicularizadas, por bêbados desvairados, à procura da sua sombra.
É tudo isso que o russo conta.
O striptease das meninas que faziam a primeira comunhão, a tourada nos aristocráticos jardins do palácio de Queluz, o enjaulamento no jardim zoológico do proprietário do Bogotá, a corrida maluca de carro através de Albufeira, o fogo de artificio no cemitério dos Prazeres.
Os estridentes vómitos e flatulências do meu amigo no hotel Tivoli de Sintra, após um belo repasto, acompanhado de um bom e muito vinho.
Enfim uma farra por mês, uma purga tanto física como moral.
Este era o retrato de dois pseudo-artistas frustrados com o mundo e com a vida.
Relembro uma entrevista, não sei para que jornal, que uma jovem jornalista me fizera, devido à instabilidade provocada pelo fogo de artificio no cemitério.
Claro que estivemos com os costados na tarimba da esquadra da Polícia durante uns dias, mas o gozo valera a pena.
- Qual o motivo que o levou a fazer tal coisa?
- O ímpeto.
- Nem mediu as consequências de tal acto?
- Não! Apenas me apeteceu…
- Se não escrevesse, senhor Daniel, que faria?
- Seria gangster, menina. Al Capone... conhece? Vem no dicionário. Escrever provoca doença.
- Que tipo de doença?
- Doença de tudo. Doença da alma, da cabeça e da própria consciência.
- Qual o seu remédio?
- Não existe remédio, boneca…
- O senhor Daniel é um anarquista.
- E a menina, uma grande burra!
(...)
Texto: In "O lado escuro da lua" (Não editado)

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

O sorriso da lágrima


Sabes?
Hoje foi um dia difícil. Agora já noite sinto, no fundo da garganta, aquele arranhar, aquela vontade de chorar.
Foi um dia que não me lembro de ter há muito tempo. Ou será o inverso?
Quero chorar de raiva, de solidão, de amargura e de alívio. Não me lembro de me sentir tão só há tanto tempo. Quero chorar para tentar aliviar o coração, para tentar arrefecer todas as ilusões de amores e contos de fadas que cá dentro, ainda se acalentam e vivem da minha personalidade sonhadora.
Quero deitar-me na cama, agarrar a almofada e contar-lhe sonhos enquanto ela segura as minhas lágrimas que teimam em sair. Enquanto ela me sussurra canções de embalar como quando era menino, enquanto me ampara no seu regaço. Quero mostrar-lhe o quão salgado está o meu coração.
Mas não o vou fazer. Não vou carregar a minha almofada com lágrimas que me adormecem e não vou deixá-la cantar as músicas que me embalam na solidão. Não deixá-la tomar em si, os meus problemas e hoje vou tentar não dormir encolhida no meu mundo. Hoje vou deixar a minha mente vaguear, vou deixar o meu coração sorrir e não vou ter medo de acordar.

Hoje, mas só hoje, vou sorrir à lágrima.

domingo, 1 de novembro de 2009

Nota 10


Este fim-de-semana andei afastado um pouco da blogosfera, e hoje qual o meu espanto ao ver que tinha não um, não dois, mas sim três selos “Nota 10” para o meu cantinho de sonhos.
Agradeço do fundo do coração:

Á brilhante e amiga Luz
http://atomovida.blogspot.com/

Á minha amiga do desassossego Milhita
http://milhita-milhita.blogspot.com/

Á assídua leitora do meu espaço Carla
http://tatuagens-carla.blogspot.com/


1- Escrever uma lista com 8 características
2- Convidar 8 bloggers para receber o selo
3- Comentar no blog de quem lhe deu o selo
4- Comentar no blog de quem escolheu.

Não vai ser tarefa fácil, porque eu próprio não me conheço… aqui vai resumidamente:

Amigo
Apaixonado
Simpático
Sensível
Sincero
Sonhador
Teimoso
Sempre na lua


Agora é assim, os blogues aos quais oferecia já foram escolhidos :(
Assim quem quizer é só escolher o selo e levar…
Obrigado